Maria Teresa Rita Lopes – Mãe (4)

Maio 5, 2024 - Leave a Response

Aspirei

o pano bordado

por tuas mãos

cada ponto

a sólida sílaba

de um poema

dos que fazias

cosendo a roupa

cozendo o pão

alimentando

os seres saídos

do teu ventre

insuflando

vida

nas coisas inorgânicas

Maria Teresa Rita Lopes (Faro, 12/9/1937)
Ensaísta, poetisa e dramaturga, investigadora, uma das maiores especialistas contemporâneas sobre Fernando Pessoa, professora catedrática, licenciada em Filologia Românica – FLUL-, doutorada pela Sorbonne.

Al Berto – [Tudo se Tornará Branco…]

Maio 1, 2024 - Leave a Response

“r. forte 12 nov 1985

Tudo se tornará branco quando eu morrer. é um esforço inútil

gastar a vida a escrever, mas vivo apaixonadamente essa inutilidade.

de resto, mais nada sei fazer, mais nada posso fazer. neste país de es-

quecimento. escrever sabendo de antemão que não haverá nisto qual-

quer possível ressurreição. eis o que me resta: ser eterno no segundo

que passa.”

Al Berto, Diários

Al Berto (Coimbra, 11/1/1948 – Lisboa, 13/6/1997)
Pseudónimo de Alberto Raposo Pidwell Tavares
Poeta, pintor, editor, animador cultural, um “coimbrense-siniense” único.

Sophia – CHAMEI POR MIM

Abril 29, 2024 - Leave a Response

Chamei por mim quando cantava o mar

Chamei por mim quando corriam fontes

Chamei por mim quando os heróis morriam

E cada ser me deu sinal de mim

ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner, OBRA POÉTICA I

Sophia de Mello Breyner Andresen (Porto, 06/11/1919 – Lisboa, 02/07/2004)
Poetisa, contista, autora de literatura infantil e tradutora, a 1.ª mulher portuguesa a receber o prémio Camões (1999)

Natália Correia – [De Amor…]

Setembro 13, 2023 - Leave a Response

“De amor nada mais resta que o Outubro

e quanto mais amada mais desisto:

quanto mais tu me despes mais me cubro

e quanto mais me cubro mais me avisto.

[…]”

Natália Correia (Fajã de Baixo, S. Miguel, 13/9/1923 – Lisboa, 16/3/1993)
Poetisa, romancista, ensaísta, jornalista, dramaturga.

Agostinho da Silva – [Pois, o 25 de Abril Veio…]

Abril 25, 2023 - Leave a Response

“ Pois, o 25 de Abril veio e eu fiquei na mesma… depois de reflectir bem, achei que teria alguma em decidir se tinha sido realmente o Salazar que me tinha demitido ou se fui eu que me demiti a mim próprio (…)

  Mas logo que o Mário Soares foi nomeado Primeiro-Ministro, apressou-se a mandar-me um recado onde dizia:

 “– Diga-me a que horas é que está em casa, que eu quero visitá-lo!”

E eu pensei: “Não senhor. Não me visita, porque agora já não é meu aluno! Agora é o Primeiro-Ministro de Portugal e quem vai visitá-lo sou eu (…).”

Dias depois fui recebido e conversámos à vontade. A certa altura, o Mário Soares perguntou-me:

“ – Neste momento, o que é que está a fazer, está a trabalhar para alguma instituição?”

“ – Sim, estou ali na ICALP, a fazer uma pesquisa histórica…”

“ – Em relação ao seu afastamento do ensino, foi demitido? * Nunca o reintegraram?”

“ – Também nunca pedi isso…”

E ele disse:

“ – Bom, então vou pedir eu!”

“ – O senhor é o Primeiro-Ministro, portanto manda e faz como quiser.”

 Ele redigiu de imediato o decreto, mas o Eanes vetou-o (…) dou-me bem com ele e com a mulher, só que ainda não tive ocasião para lhe dizer como fiquei agradecido por ele ter agido assim.”

* “(…) demitido por me recusar a assinar um papel onde tinha de jurar que não pertencia a nenhuma sociedade secreta. Claro que o que eles visavam era sobretudo a Maçonaria, que representava uma força que o regime temia.” 

SILVA, Agostinho da, A Última Conversa , Entrevista de Luís Machado

Agostinho da Silva (Porto,13/2/1906 – Lisboa, 3/4/1994)

Filósofo, poeta, ensaísta, professor, licenciado em Filologia Clássica (1929), doutorado com louvor (1929), colaborador da Revista Seara Nova, fundador do Núcleo Pedagógico Antero de Quental (1939), cofundador de universidades no Brasil, criador de Centros de Estudos

Sophia – Liberdade

Abril 25, 2023 - Uma resposta

Aqui nesta praia onde

Não há nenhum vestígio de impureza,

Aqui onde há somente

Ondas tombando ininterruptamente,

Puro espaço e lúcida unidade,

Aqui o tempo apaixonadamente

Encontra a própria liberdade.

Sophia de Mello Breyner Andresen (Porto, 06/11/1919 – Lisboa, 02/07/2004)
Poetisa, contista, autora de literatura infantil e tradutora, a 1.ª mulher portuguesa a receber o prémio Camões (1999)

Joaquim Pessoa – Canção da Minha Tristeza

Abril 19, 2023 - Leave a Response

Meu coração não está nas largas avenidas
nem repousa à tarde, para lá do rio.
Nada acontece. Nada. Nem, ao menos, tu
virás despentear os meus cabelos.

Nem, ao menos, tu, neste tempo de angústia
vens dizer o meu nome ou cobrir-me de beijos.
Ah, meu coração não está nas largas avenidas
nem repousa à tarde, para lá do rio.

A cidade enlouquece os meus olhos de pássaro.
Eu recuso as palavras. Sei o nome da chuva.
Quero amar-te, sim. Mas tu hoje não voltas.
Tu não virás, nunca mais, ó minha amiga.

Nada acontece. Nada. E eu procuro-te
por dentro da noite, com mãos de surpresa.
Meu coração não está nas largas avenidas
nem repousa à tarde, para lá do rio.

E tu, longe, longe. Onde estás meu amor,
que não vens despentear os meus cabelos?
Eu quero amar-te. Mas tu hoje não voltas.
Tu não virás, nunca mais, ó minha amiga.

PESSOA, Joaquim , in ‘Canções de Ex-Cravo e Malviver’

Joaquim Pessoa (Barreiro, 22/2/1948 – 2023/04/17)
Poeta, artista plástico, professor.

Frederico Lourenço – [Pensamento Infinito de Amor à Minha Avó]

Abril 11, 2023 - Leave a Response

“(…) não posso deixar de dirigir um pensamento de infinito amor à minha avó, cuja morte prematura acabou por se revelar abençoada, na medida em que a impediu de ver repetida na filha a tragédia da sua mãe.

Às vezes penso: o que terá acontecido a tanta roupa? E ainda hoje tenho pena de não me ter oferecido mais vezes para lhe bater as claras em castelo.”

LOURENÇO, Frederico, Amar não Acaba

Frederico Lourenço (Lisboa, 8/5/1963)
Romancista, contista, tradutor, professor universitário.

Florbela Espanca – [Se Penetrássemos…]

Março 21, 2023 - Leave a Response

“Se penetrássemos o sentido da vida sermos menos miseráveis.”

ESPANCA, Florbela, Acerca de Florbela

Florbela Espanca (Vila Viçosa, 8/12/1894 – Matosinhos, 8/12/1930)
Poetisa, 1.ª mulher a frequentar o curso de Direito na Universidade de Lisboa, percursora do movimento feminista em Portugal.

Fiama Hasse Pais Brandão – DO AMOR IV

Março 21, 2023 - Leave a Response

Esta vista de mar, solitariamente

dói-me. Apenas dois mares,

dois sóis, duas luas

me dariam riso e bálsamo.

A arte da Natureza pede

o amor em dois olhares.

Fiama Hasse Pais Brandão (Lisboa, 15/8/1938 – Lisboa, 19/1/2007)
Poetisa, romancista, dramaturga, ensaísta, tradutora
(Esposa de Gastão Cruz).